duas vezes em que me insurjo contra as classificações e em que regresso com as classificações tão claras como um mapa, as ruas que outros já percorreram com minúcia, descrevendo cada detalhe, olhando para cada imperfeição da parede e em que eu entro despreocupada sem grandes elaborações no pensamento, a entrada num livro que eu prefiro e a que julgo ser a porta da frente. foi o southern gothic nas histórias de Flannery O'Connor e o pós-modernismo de Pamuk.
um monumento este livro, que se vai demorar na minha vida apenas um pouco menos do que a Montanha Mágica, e que leio à mesma velocidade, lentidão e muitas vezes velocidade negativa, ler os mesmos capítulos várias vezes, voltar atrás em vários sítios, como se também eu deambulasse na labiríntica Istambul e como se também eu acompanhasse as multidões que atravessam a ponte de Galata. aliás, gostaria de traçar a caneta verde os percursos das várias figuras sobre o mapa de Istambul, tal como Galip que sobrepõe sob a luz os mapas de Damasco, Istambul e Tripoli (era Tripoli?)
o tema, e talvez a razão de ser da atribuição da etiqueta pós-modernista, é a identidade, individual ou colectiva, a identidade que se desfaz até à confusão entre o protagonista, o perseguido, o perseguidor e o próprio leitor, o narrador, o autor, todos se encontram num jogo de espelhos tremendo que se desenrola no espaço-labirinto e carregado de estranhos sinais - nos rostos, nos manequins, nos mapas, nas crónicas de jornal - o barulho que jamais se cala dos sinais, a impossibilidade do silêncio de uma cidade que cresceu de um para catorze milhões em pouco mais do que uma vida.
o cinema, ligado à vontade indomável de ser outro, um fio condutor da narrativa e isto mesmo tudo o que pensei por causa do L. que tem andado atormentado (pure awe) com a cara desfigurada de Alexandra. nesta altura de dissolução planetária, de alteração das regras da racionalidade, os acontecimentos mais básicos parecem missões impossíveis: envelhecer simplesmente, manter um pensamento linear, aprofundar o silêncio sem os carnavais-zen, reconhecer-se.
por outro lado, o esforço conservador não evita algumas questões: conservar o quê na corrente que passa, conservar qual paisagem protegida, que camada do tempo se pretende parar, que encenação da história se pretende suspender.
light gazing, ışığa bakmak
Tuesday, December 11, 2012
Publicado por Ana V. às 10:54 AM
TAGS Orhan Pamuk
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