light gazing, ışığa bakmak

Sunday, January 1, 2012

A Separation, a mentira

(no centro do mundo). um filme brutal, no sentido da crua brutalidade emocional com que as personagens convivem. brutal também no modo de nos serem apresentadas as situações, como se não houvesse introduções nem bons dias nem rodeios. a história decorre como um policial da vida privada; a cada passo se revela uma outra verdade, e esse desvendar implica sempre uma mentira. todos mentem, todos têm algo a esconder -os seus motivos, as suas justificações de existência, os seus defeitos para além da classe social, da fé ou da educação: ele peca por orgulho, a grávida pela mentira (mente ao marido mas não poderá mentir ao seu deus), a mulher pela ambição, talvez, o marido enganado pela impulsividade.  chocante ainda o momento em que a rapariga vê o pai como homem e já não como ideal.

li, talvez no Expresso, que o filme poderia ser mais um qualquer drama familiar não fosse iraniano, mas não concordo com isso. nunca é um qualquer drama, está tecido de forma exemplar, rápida, ansiosa. tão bem encadeada que só reparo cá fora: tudo começa afinal na mulher que sai de casa, é dela a culpa, culpa de abandonar a família e de querer imigrar. há muitos divórcios no Irão, diz Asghar Farhadi na conferência de imprensa, diz que não é contra nem a favor, mas é claramente contra, contra estas modernices da classe mais elevada. contra a mulher ter ido trabalhar, mentindo ao marido que não a sustenta e que tantas vezes é preso. eu não gostaria de estar no Irão, mas nesta Separação muitas ideias são possíveis, algumas delas contraditórias. a humanidade de cada uma das pessoas e como ela está à vista- gostei de ser enganada por Asghar Farhadi, é um pouco assustador.

o que me faltou: o que seria mais óbvio, amor.




o rosto de Sareh Bayat é muito bonito e faz pensar em distantes reinos persas, contos exóticos e outros milénios.

hoje anunciam-se novas sanções ao Irão.

hoje também li na Dublinesca (pelo meio de uma cena satírica chegando ao ridículo com o recém-budismo da mulher): "Grandes contrastes entre a grandeza e o prosaico, entre o impulso heróico e o caril de frango. Escapa-se-lhe uma risada. Talvez o impulso heróico seja, hoje em dia, algo completamente vulgar e corrente. Perante tudo isto, o que deve ser realmente o impulso heróico? Pensa nesse impulso como se fosse algo muito evidente e, de facto, não sabe bem o que é." felizmente, não há impulsos heróicos em A Separação mas, de certo modo, "Ouve-a relativamente. Sente-se pasmado perante a irrupção do budismo na sua vida. A verdade é que a preferia quando ela falava todas as tardes ao telefone com a mãe ".. não é senão a mesma falta. o amor é um sentimento amarrado por outros constrangimentos.

que gosto sempre de ler, no NY Times. e no New Yorker. (que bem visto: "Farhadi—unlike his compatriot and fellow-director Jafar Panahi, who is currently serving six years in prison, and is banned from making films for two decades—may be tolerated by the Iranian regime, but, if I were one of the country’s cultural commissars, the look that passes between those two young females might easily trouble my conscience, or my sleep."

Read more http://www.newyorker.com/arts/critics/cinema/2012/01/09/120109crci_cinema_lane#ixzz1iLhHQZYj"

outros sinais: a quota de tempo passado em cozinhas, a cozinha da mulher mais pobre, a primeira apresentação do pai tentando pôr a máquina de lavar a trabalhar (o que se no ocidente é uma marca positiva de ele até faz isto, no Irão nem imagino) a varanda da cozinha onde a professora vai fumar um cigarro (again: normal cá, mas lá duvido). a mãe, a vizinha, a explicadora. há tanto respeito e não há.

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