Recuando até 2001, vi "Loin"/"Longe" de André Téchiné, disponibilizado em Portugal pela Atalanta Filmes. Não é um filme dramático, nem recorre a técnicas cinematográficas extremas, os personagens não são extraordinários, a história não nos faz agarrar a cadeira de nervoso, não se chora, ri-se um pouco, não é negro nem trágico, nem sequer parado e excessivamente palavroso. É um filme suave e sem dramas artificiais, os dramas reais subjacentes existem. Retrato de uma cidade e das preocupações de quem nela vive. Imagens equilibradas e belas num filme que lembrarei sempre que se fale de Tânger.
Gostei muito das três personagens em torno das quais corre a história, na sua humanidade e no que têm de dúvida, de incongruências e de patético. Cada um muda de ideiais pelo menos uma vez, gente normal no seu quotidiano, cada um com a sua teia de conhecimentos e de motivações, cada um com uma visão limitada do mundo que o rodeia. Ninguém sabe mais do que os outros, cada um se movimenta nos limites do seu conhecimento e do seu desejo. Os sonhos são uma parte importante do tempo, impelem as personagens que parecem eternamente insatisfeitas, balançando entre a aceitação e a integração e a mudança. Said é o único que persegue sem tréguas o sonho da Europa, que fica logo ali do outro lado. Já tentou a passagem cinco ou seis vezes, ficamos a pensar que consegue. O final do filme representa para os três uma mudança irreversível (assim o pensam): Serge não voltará a Tânger e Sarah não o reencontrará nem emigrará para o Canadá, Said consegue finalmente a passagem para a Europa.
Um filme que não é entretenimento, que não é agressivamente de autor, que não é panfletário. Um filme que refrescantemente não pertence a categoria nenhuma nem pretende fazer nada de um modo ostensivo. Ou, como disse Mark Peranson em "Senses of Cinema": "Loin (André Téchiné, 2001): Largely dismissed on the festival circuit and almost unseen in America, Téchiné's latest Loin is not at all a weak effort. Shot on Digital Video, it's a typically intense, focused drama, filmed in Techine's characteristically muscular, rhythmically disorienting style. Set in Morocco and concentrating on a French truck driver and his relationship with a young Moroccan man desperate to emigrate to France, it's small-scaled and unspectacular, but emotionally perceptive, moving, and honest as ever." (No mesmo artigo e de um mesmo fôlego, Mark afima: "Is there any doubt that Manoel de Oliveira is the greatest living filmmaker? We should clone him before it's too late." Quando alguém que escreve se não me engano no Canadá afirma isto, tenho vontade de rever Manoel de Oliveira.)
Tânger, estrela do filme e um local aprazível para filmar, tem uma história cultural de inter-relação com a Europa quase única. Foi essa história que não consegui descontinar neste filme (recordei "The Last Friend" the Tahar Ben Jelloun e não vi a mesma cidade, em Jelloun cheia de passado e em Téchiné cheia de presente).
E a sinopse do filme, tal como é apresentada pela Atalanta Filmes: Serge é um camionista, que faz a travessia da Europa a África e vai regularmente a Tanger onde encontra a sua amante Sarah e o seu amigo Said. Pela primeira vez, Serge vai ceder à tentação do tráfico de droga enquanto Said vive com uma ideia fixa – passar clandestinamente para a Europa e descobrir o mundo.
O trailer português, aqui.
light gazing, ışığa bakmak
Monday, December 3, 2007
Longe
Publicado por Ana V. às 10:37 PM
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1 comment:
penso que estes filmes discretos são os melhores. porque mais realistas.
ainda não vi o filme. mas recomendo-te um americano: "Podes Contar Comigo" de Kenneth Lonergan
um beijo
jorge
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