Devo ter andado muito distraída: o novo livro de poesia de Mia Couto saiu no último dia de Setembro e só antes de ontem o comprei, ansiosamente. Não resisti e fui lendo logo pela rua.
Apenas o segundo livro de poesia deste autor, editado pela Caminho. Tal como a Grace e a Sombra, resta-me passar a palavra ao escritor e exortar à compra do livro. Achei a escrita limpa, quase anedota, por vezes, canção de ainda protesto, outras. Um poeta que se adivinha calmo, por um lado, e extremamente preocupado com o tempo que passa, por outro.
O outro idioma
Inquirido
sobre a sua fluência
em português, respondeu:
- Tenho duas línguas:
uma para mentir,
outra para ser enganado.
A professora
ainda perguntou:
- E qual delas é o português?
- Já não me lembro, respondeu.
--
O Piso e o Passo
Envelheço como o sapato:
quanto menos sirvo
menos aleijo o chão.
Antes,
eu buscava
conhecer um lugar.
Agora,
apenas quero
um lugar
que me conheça.
---
Desleitos
Recuso o leito.
Quero dormir
onde não tenha cabimento.
O problema da cama
é que, tal como no caixão,
ganhamos o tamanho da tábua.
Para sonhar,
prefiro o inteiro chão.
Tenho a sede
do embondeiro:
Ao invés de beber,
Eu engulo o chão inteiro.
---
(a pedido)
Mulher
Solteira, chorei.
Casada, já nem lágrima tive.
Viúva, perdi olhos
para tristezas.
O destino da mulher
é esquecer-se de ser.
light gazing, ışığa bakmak
Thursday, November 1, 2007
Idades Cidades Divindades, de Mia Couto
Publicado por Ana V. às 11:34 PM
TAGS Biblioteca de Babel, Mia Couto
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3 comments:
muito bom mesmo.
um grande beijinho
jorge
Procuro o poema "mulher" deste livro, podias publicá-la? Muito obrigada
Agata, por este pedido já dei 3 voltas à casa e a todas as prateleiras, já cheguei à conclusão que preciso de arrumar os livros, já tirei uns 3 da prateleira para "ler a seguir" e não encontrei! Mas não faz mal: amanhã sem falta ponho aqui o poema. :)
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