light gazing, ışığa bakmak

Sunday, December 2, 2007

Arte no tempo



As obsessões, a minha obsessão. Não há muita falta de consenso quando se afirmam os lugares-comuns do novo milénio, ou final do anterior: massificação, despersonalização e excesso de imagens, desenraizamento, fragmentação, globalização e consumo. Na arte, única, cada sobrevivente é obrigado a inventar uma nova expressão, chocante, individual, muitas vezes obsessiva (já em Stravinsky, na Poética da Música?). Todos os meios são hoje possíveis, os géneros confundem-se, a obrigatoriedade de permanência no tempo foi quebrada pelas instalações, mais do que temporárias.



Allan McCollum, nascido em Los Angeles em 1944, embebe as suas obras da própria dificuldade de criar novidade em tempo de saturação. Interessante também, para além da repetição obsessiva, é na minha opinião a ideia de criar e iniciar um projecto artístico que continue depois da sua morte. Um pouco como o artista criador/capataz que tem ao seu serviço um exército de ajudantes, McCollum integra a sua própria morte na obra que desenvolve e entrega a compleição da mesma a terceiros.



Estou a referir-me ao seu projecto "Shapes" (Formas), iniciado em 2005 e que será desenvolvido ao longo da vida do artista, prevendo McCollum que o projecto continue após a sua morte. O objectivo é criar uma forma individualizada para cada pessoa no planeta à data que se estima aconteça o pico da população mundial, em 2050. Nessa data, calcula-se que a população da terra se situe entre os 8 e os 20 mil milhões de pessoas, sendo o número mais credível cerca de 9 mil milhões. O que McCollum se propõe fazer é criar mais de 9 mil milhões de formas diferentes até 2050.



Aqui um texto do próprio sobre o projecto (tradução minha, original aqui):

"Trabalhando ao longo dos últimos anos, concebi um novo sistema para produzir "formas" bi-dimensionais únicas. Este sistema permite-me fazer formas originais de modo a haver uma forma para cada pessoa do planeta. Também me permite controlar a produção das formas de modo a garantir que não haverá duas iguais.

Tendo em conta a presente taxa de natalidade, estima-se que a população mundial atingirá o seu "pico" em meados deste século e depois possivelmente começará a diminuir. O número de pessoas vivas nessa altura situar-se-á entre os 8 mil milhões e os 20 mil milhões, dependendo dos factores considerados e de quem faz a estimativa. A mais recente estimativa publicada pelas Nações Unidas coloca o número em cerca de 9,1 mil milhões de pessoas no ano 2050.

Para garantir que o meu sistema será capaz de incluir todas as pessoas, organizei-o de modo a produzir mais de 31.000.000.000 formas diferentes, o que é mais do que as estimativas mais altas requereriam.

Nesta altura, cerca de 214.000.000 destas formas foram postas de lado para experimentação criativa. Poderão ter finalidades diferentes—não só artísticas e para projectos de design, mas também para outras práticas sociais: como prendas, prémios, marcadores identificativos, emblemas, insígnias, logotipos, brinquedos, lembranças, ferramentas educacionais, etc.

Neste momento uso o meu computador de casa para construir ficheiros "vector" no Adobe Illustrator que permitem produzir novas formas de muitos modos diferentes. As formas podem ser impressas graficamente como silhuetas ou contornos, em qualquer tamanho, cor ou textura, e usando toda a variedade de software gráfico; ou, podem ser usadas por máquinas de protótipos e equipamento informático de controlo numérico (CNC)—como routers, cortadoras a laser ou jacto de água—para construir, esculpir ou cortar as formas em madeira, plástico, metal, pedra ou outros materiais.

O sistema básico para fazer as formas está agora completo, mas o projecto de construí-las é demasiado vasto para que eu o possa completar sozinho ou durante a minha vida. Por esta razão, estou a organizar o trabalho de maneira a que outros possam continuar e completar as formas em falta na minha ausência. Também estou a disponibilizar formas a terceiros, na esperança de que outras pessoas arranjem maneiras interessantes de as usar."
(2006)



One in a million, para ti, Rui.
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Em Portugal McCollum já esteve exposto na Fundação de Serralves ("Eu achei muito interessante a nossa visita de estudo. Vale a pena ir ver a exposição Anos 80 no Museu de Serralves. É importante conhecer as obras de arte desses anos para nos dar a ideia como foram os anos 80 e conhecer os artistas que fizeram aquelas obras. O artista que mais gostei foi Allan McCollum que fez 216 quadros, cada um de cor diferente. É uma obra muito colorida que se identifica bem com os anos 80. Esta exposição também é boa para "refrescar a memória..." dos adultos que viveram esses anos." Henrique Siza Vieira, 11 anos, no blogue dos torrinhas netianos) e está presente, como não podia deixar de ser, na colecção Berardo (Collection of 60 Drawings 1988-90)

Exposição na Galeria Petzel em Nova Iorque em Dezembro de 2006
Alguma informação sobre o projecto na página de McCollum.
E todas as críticas que importam, aqui a do NY Times , em particular.

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