light gazing, ışığa bakmak

Friday, July 23, 2010

alligator

"O dinheiro só tem uma língua, enquanto ele e o seu sócio partiam todos os dias de madrugada, de início juntos na piroga, mas depois separadamente, um na piroga e o outro na canoa, um com a clavina escalavrada e corroída, o outro com a faca, um pedaço de corda com nós e uma matraca de pinho com o tamanho, o peso e a forma de uma clava turíngia, passeando os seus pesadelos pleistocénicos rumo acima e rumo abaixo dos negros canais secretos, que rasgavam a planura cor de cobre. Lembrava-se também disso, dessa primeira manhã em que viu da varanda raquítica ao voltar, ao sol nascente, uma pele pregada à parede, secando. E estacou a olhar tranquilamente para ela, pensando com serenidade e calma: É isto. É isto o que ele faz para comer e viver. Sabia que era um couro, uma pele, mas não podia dizer de que animal por associação, por raciocínio, ou sequer lembrança de qualquer gravura da sua juventude morta. Não sabia, mas compreendia que esta era a razão, a explicação para o perdido casinhoto de pernas de aranha - que começara já a morrer, a apodrecer da estacaria para cima quase antes de se fixar o telhado-, posto naquela desolação de miríades germinantes, encerrado e perdido dentro do abraço furioso da escorreguenta terra-égua e do sol-garanhão, tudo adivinhado por meio de pura relação de uma espécie com a outra, o labroste e o mouchão de ratazanas, os dois unos e idênticos por causa da mesma dispensa regateada e do fado mesquinho de trabalho duro e incessante, não para ganhar segurança futura, uma conta no banco ou até mesmo um pecúlio numa lata enterrada para uma velhice fácil e pachorrenta, mas apenas autorização para subsistir e poder comprar o ar para sentir, e sol para beber, no breve momento da existência de cada um."
n'O Homem e o Rio, Faulkner

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certamente que para os mais estilizados - de linhas mais puras, impolutas pelo factor social-moral; isto será muito feio.

2 comments:

Anonymous said...

um discorrer um bocado alongado .mas nada contra .há quem o faça em canção e nada contra .bem escrito

Ana V. said...

a sério?!

 
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