no campo verde que fica entre as pistas de aterragem estão muitos corvos, corvos que querem ser máquinas quem sabe. na cidade ainda não os vi. Hamburgo vai ficar ligada a Austerlitz, de Sebald que fui devorando pelo caminho, de tão imparável leitura como os Anéis de Saturno. é através de Austerlitz, o sabedor de edifícios, que o caminhante Sebald olha desta vez para os vários lugares da sua cabeça. nem a propósito, Hamburgo é o local dos edifícios, altos e novos por todo o lado, imponentes e pesados, como nunca senti mais a Norte. as pessoas movem-se sérias, falam baixo umas com as outras, apanham sol até seriamente e neste presente simpático de lojas, editoras, marcas e tours turístico escondem-se os pecados familiares de poucas décadas. as complicadas relações com o passado e as estratégias quase filigrânicas que construímos para sobreviver vêem-se aqui mais do que em outros locais do nosso passado comum. mas ainda e sempre, um épico-heróico que faz parte da pré-ideia que temos espalha-se pelos edifícios da cidade, antigos ou novos como a ElbPhilarmonie, projecto colossal e que serve o fato que escolhemos vestir aos alemães. olho para o navio gigantesco que se ergue e ouço Bruckner ou Beethoven ou a missa de Bach que soam por entre centenas de gruas gigantescas e o rolhar da água, o ranger dos cabos, os apitos graves do grandes navios que ali passam. ao seu lado, sobem os armazéns de tijolo onde desde há séculos se acumula riqueza, se negoceia e se dispõe do mundo dos outros. todas as grandes companhias marítimas estão ali, no Hafencity, mais uma vez uma nova cidade que se constrói em cima do seu passado. uma obra semelhante ao que seria a nossa Expo se o mar estivesse no nosso presente e não apenas nas ilusões colectivas de grandeza patriótica. mas sem Bruckner, talvez um Seixas, e com ele saio para o dia, para não resistir a um certo bem-estou lamecha da minha geração.
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"Devia haver, disse ela ainda, quem elaborasse uma catalogo das nossas construções, a contar das maiores para as mais pequenas: tornar-se-ia logo evidente que a arquitectura habitacional abaixo do tamanho normal, isto é, as cabanas rurais, os eremitérios, as casinhas dos guarda-rios, os mirantes, as casinhas de brincar no jardim, é aquela que exprime um vislumbre de paz, ao passo que ninguém no seu perfeito juízo dirá que um edifício grande como, por exemplo, o Palácio da Justiça de Bruxelas, no velho Monte da Forca, lhe agrada. Quanto muito, fica-se espantado, e esse espanto é já de si uma forma antecipada do horror, pois de algum modo sabemos naturalmente que os edifícios ultradimensionados lançam já a sombra da sua destruição, concebidos que são desde a origem com vista a uma existência futura enquanto ruínas.", Sebald em Austerlitz.
light gazing, ışığa bakmak
Thursday, September 23, 2010
só porque
Publicado por Ana V. às 6:05 AM
TAGS Hamburg, Stuff, W. G. Sebald
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3 comments:
"movimento em falso" o pecado de gerações anteriores se terem entregue com entusiasmo ao nazismo .De livre vontade e sem consciência ,tranquilamente,um passado que assombra ainda hoje .todos os horrores foram praticados e ainda hoje metade dos acessórios de sadomasoquismo são do tempo desse fascismo ,ter tido antepassados que puseram as formas mais simples de humanidade de lado e se entregaram sem pestanejar á mais descarada bestialidade
sob a sombra de goethe um escritor percorre a alemanha ,e vai tendo por companheiros de viagem uma actriz ,um velho que representa o passado nazi e a sua neta acrobata ,a certa altura há um quase homicidio ,um ajuste de contas com o passado.O conflito de valores que leva o filho a meter o pai no lar para não mais o visitar e a confessar á funcionária que não sente amor por ele em monster`s ball
era favor apagar
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