light gazing, ışığa bakmak

Sunday, October 3, 2010

desassossego



tenho uma relação duvidosa e conturbada com moving images que saem de livros perfeitos, até imperfeitos. este desassossego não me largou durante todo o filme, grande empreendimentos, grandes recursos e grandes apoios, penso, da sociedade cultural de Lisboa e não é de financiamento sequer que falo. João Botelho serve com este filme uma necessidade de identidade muito para além de Bernardo Soares, ou Pessoa, mas a de um grupo alargado que não se encontra representado em lado nenhum e que gostava de se encontrar. e que melhor encontro do que este texto transposto para um hoje deprimido e vazio, um tempo sem tempo nem referências. Cláudio da Silva esteve bem na sua figura de porta-voz do que somos hoje, embora não seja um retrato feliz.

o modo de exibição deste filme é outra rebeldia: só em cine-teatros e outros espaços culturais "onde não se coma pipoca". não que eu ache mal, tenho um fetiche especial por cine-teatros a começar pelo Lethes, subindo para o Garcia de Resende, o de Serpa, Viseu, Portimão, Guarda, Beja, Alcobaça e a tantos por onde passei profissionalmente em pequenas tournées pelo país. e se é verdade que detesto a hegemonia lusomundo cinema-city, é verdade que esperava este filme nos cinemas Medeia. e, pior ainda, também é verdade que estive a um passo de não o conseguir ver. os poucos dias em Lisboa foram insuficientes. o outro lado da moeda: deseja-se o que se não tem e a corrida aos bilhetes foi, decerto, também um desejo de entrar nesse pequeno círculo dos que vão ver o Desassossego. dito de outro modo: ainda creio na democratização da cultura.

as imagens são, algumas, muito bonitas. gostaria de ter visto ainda mais Lisboa, incluindo a surpresa das imagens construídas, ícone sobre ícone, e a localização improvável da Sé, da Casa dos Bicos. outras nem tanto. parece-me difícil associar imagens simbólicas a um realismo quase sórdido. ficamos aqui ou ali afinal. a mesma dúvida no tempo histórico que me manteve desorientada durante algum tempo. é passado, não é mas afinal sim só pode ser (e os penteados, senhor!), é hoje mas não era hoje, um concentrado. o apartamento, quarto modesto, balança entre o loft muito cool e o miserável de uma parede sem azulejos. o baton é sempre tão vermelho, tão vermelho. --guardo o Livro, com o cuidado devido: "Porque o Homem é outra espécie de ente. Se é inferior, recomendo-lhe que use de quantas mulheres puder: faça isso e sirva-se do meu desprezo quando. E o homem superior não tem necessidade de nenhuma mulher. Não precisa de posse sexual para a sua volúpia. Ora a mulher, mesmo superior, não aceita isto: a mulher é essencialmente sexual."

aqui as notas, em .pdf.
entrevista no Público.
opinião. opinião.
:))

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