light gazing, ışığa bakmak

Saturday, November 17, 2012

museu (2)

"Na parte mais pequena do templo, atrás de um vestíbulo que impede a luz de penetrar, há uma cela tenebrosa que parece escavada na rocha viva. À luz fraca de uma lamparina de azeite, vemos que a cela está ocupada a todo o comprimento por um leito de pedra, sobre o qual, numa atitude de quem dorme, está estirada a estátua do deus Xiva. A pequena chama da lamparina de azeite só ilumina uma parte da estátua de cada vez que se desloca, de modo que, vendo ora a grande mão divina abandonada no chão, ora a cabeça com as pálpebras descidas apoiada no travesseiro, ora as pernas afastadas e estendidas, fazemos uma ideia fragmentária, e talvez por isso ainda mais misteriosa, do somo em que o deus está mergulhado. O contraste entre esta letargia nas trevas e a luz resplandecente do sol tropical sobre o mar em perpétuo movimento é tão forte que parece impossível que seja casual, porém o significado escapa-nos, como sempre acontece quando se passa dos símbolos obscuros mas precisos da religião para a clareza enganadora da . poesia. De qualquer modo, tal como o templo, também o deus Xiva está a morrer. E também ele, dentro de alguns séculos, se não repousar sobre o veludo de um museu, será comido pelas ondas e reduzido a um dos muitos seixos que existem na praia de Mahabalipuram."
Alberto Moravia em Uma Ideia da Índia.

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