na segunda circular, olhar para o lado norte da cidade e o imenso vale de construções acinzentadas apenas interrompidas pelas manchas de verde pálido que são os antigos matos agora convertidos no que chamam hortas, de onde urbanos muito deles na miséria tentam retirar alguma coisa de uma terra carregada de elementos químicos pouco desejáveis. o céu está carregado e os fumos da capital não escapam e enchem o horizonte de uma cor amarelada, o cheiro com a mesma cor.
também eu, como os outros. passo ao longo de toda a fachada de prédios de Benfica e lembro-me da B., a orgulhosa mulher do médico, gabarolas do seu estado na vida, do carro, do largo apartamento em Benfica com muitos quartos e relembro o início daquele bairro, quando os prédios ainda cheiravam a novo e as cores eram vivas e havia roupa branca nas marquises e algumas plantas recém-transplantadas para detrás da muralha de vidraças. era um sonho moderno, um apartamento lá no alto, com uma vista de prédios, elevadores, televisão, porteiros, a possibilidade de descer ao Califa, ter empregada a limpar as divisões da nova classe média alta em Benfica.
agora, crise ou não, quem cresceu nestes blocos quer ou já saiu a toda a velocidade. ter canteiros com aromáticas, aprender a fazer coisas à mão, reciclar, reocupar casas antigas em que os soalhos falam quando passamos. a cidade são várias cidades, os centros das cidades são fugidios. há os centros oficiais que figuram nas placas rodoviárias, há os centros onde a vida existe, há os centros para onde mais se vai.
em Istambul, outra cidade à boca do mar, fundada sobre sete colinas, a capital europeia da cultura de há três anos teve os efeitos perversos das obras exageradas e à pressa das cidades do sul da europa. mas ali, apesar da democracia e das eleições e dos partidos, toda a gente sabe que manda um partido, um governo, um presidente (o sonho do nosso mais que tudo). e toda a gente sabe que há escritores presos, que há secretas violentas, que há processos nebulosos. ali, a capital europeia da cultura causou a demolição de bairros inteiros com mais anos de existência do que a grande maior parte dos países da dita europa, a fim de se poderem erguer bairros sanitados de edifícios limpos, ruas largas e apartamentos caros com os toques decorativos que aliam a tradição e a modernidade. o boom construtor agradece e ficamos a conhecer melhor aquilo que se pensa que a europa é: uma manobra de expulsão de minorias, um embelezamento de fachada, um jogo imobiliário e financeiro: substituir o mato pela relva, resumindo.
a demolição de Tarlabaşı é apenas um pouco mais violenta do que a construção dos bairros periféricos de lisboa, tal como o povo turco é mais violento do que o povo português. a ideia de um positivismo económico, de avançar na vida, de progresso e modernidade à imagem de outros países que se imagina perfeitos [o lá fora] acaba por ser a mesma. se há algo a dizer (pedras a atirar), são apenas as pedras dos direitos humanos. de resto, todos estivemos, ou estamos ainda, culturalmente under the influence.
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The project that was started on since 2005, has come to the terminal stage. ‘’Tarlabaşı Renovation Project’’ won’t only renovate the buildings, through this project Tarlabaşı will be a safer, cleaner and a livable district. Tarlabaşı’s cultural richness will be preserved and through this project Tarlabaşı will reach its new, contemporary and modern appearance. With the restoration project, the exterior of the buildings will stay faithful to their original.
light gazing, ışığa bakmak
Wednesday, May 8, 2013
uma ideia de europa
Publicado por
Ana V.
às
2:43 PM
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