light gazing, ışığa bakmak

Saturday, August 2, 2014

sapato

no cais do ferry uma família alargada de gente pobre: várias mulheres, um homem, rapazes e umas oito ou nove crianças. já entraram no cais de embarque e agora estão presas naquela pequeno espaço empoleiradas sobre as escadas de acesso ao barco. as mulheres falam umas com as outras e as crianças maravilham-se com tudo, excitadas com o passeio, as novidades. por um preço mínimo, vão seguir no ferry como se fossem num grande transatlântico a ver países, como aquele que acaba de largar do cais ao lado. o homem do grupo, novo, não parece muito inteligente. a certa altura pega num dos miúdos pelos braços e simula que o atira à água. o miúdo grita. o homem volta a fazer a mesma coisa mas desta vez um dos sapatos do miúdo cai à água. a miudagem começa a gritar, o homem embaraçado ri-se mas não sabe o que fazer. junta-se gente a olhar para o sapato. o miúdo começa a chorar pelo sapato. assim se passa algum tempo com os espectadores a olhar o sapato que lentamente se afasta do cais, ele próprio a navegar um passeio de verão nas águas do corno dourado. os espectadores falam entre si criticando o disparate desta gente pobre com brincadeiras parvas. depois de grande impasse, o sapato aproxima-se de outro ferry atracado ali perto. o homem entra no ferry vazio com ar decidido de homem que vai resolver o assunto e volta a sair um um pau. assim vai tentar pescar o sapato da água mas a altura do sítio em que está para a superfície da água é grande, o sapato teima em escorregar do pau, de volta à água. de cada vez que ele quase consegue as crianças agitam-se como se estivessem a ver um jogo de futebol: foi quase golo. passados quinze minutos de tentativas o homem está perto de desistir mas antes decide uma manobra extrema e arriscada: desce do passadiço empoleirado à rasa água, em grande equilíbrio e estica-se todo para a água, as crianças abrem os olhos de susto e suspense. o homem pesca finalmente o sapato para grande alegria da pequena multidão que entretanto se formou, as crianças gritam de alegria. está salvo o dia.

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