light gazing, ışığa bakmak

Saturday, April 22, 2017

Mary Burns (O Jovem Marx, de Raoul Peck)

Imbuída em espírito político, ou melhor, muito semi-político pois desde que subscrevi o grande líder Sócrates nunca mais me apanham noutra (nunca digas nunca) e tenho sido uma nomad das ideias desde então – bem, imbuída em espírito político, fui ver O Jovem Marx. Contrariei a regra que sigo para artistas e escritores: quero lá saber das vidas e amores, interessam-me as obras, o resto é conversa cor de rosa.

Neste caso, (e como “nunca digas nunca) a candura de algodão doce do filme fez-me pensar, durante todo o filme, em: - primeiro, os milhões de mortos que seguiram; - segundo, no incrível perigo das boas intenções. Este último aspecto interessa-me particularmente até porque pinta um retrato da minha vida. As ideias, essas boas intenções humanas, e aquilo que está na base do que somos no conjunto dos seres vivos e no conjunto das galáxias a girar no espaço profundo, são o que nos transforma fatalmente em ícaros condenados. Existe alguma boa ideia sem a correspondente queda?

O filme é um pouco arrastado e pode tornar-se entediante para quem não se interessa muito pelo conteúdo, o que não foi o meu caso. Com surpresa, amei o final: Bob Dylan a cantar a Like a Rolling Stone com imagens de muitas situações posteriores ao Manifesto Comunista mas que justificaram e continuam a justificar o sonho de Karl Marx.


Feita para mim no filme foi a personagem Mary Burns, a mulher não casada de Engels, com quem tanto me identifiquei. Dela diz a Wikipédia: “Não foi escrita muita coisa sobre Mary Burns. As únicas referências directas que sobreviveram é uma carta de Marx para Engels por ocasião da sua morte dizendo que ela tinha uma boa natureza e era esperta e uma carta da filha de Marx dizendo que ela era muito bonita e esperta”. Enfim, não sabia ler nem escrever, o habitual nos confins da história das mulheres e a regra geral no apagamento radical das suas existências. Mary Burns no meu coração.

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