light gazing, ışığa bakmak

Monday, March 3, 2008

para ti, outra e outra vez

"Caminho por telhas atapetadas de mato que se há-de transformar em estrume e em viveiro de larvas depois de moído por botas cardadas, calores e invernias; e, caminhando, cruzo-me com vultos, alguns chegados da Vila. Vejo interiores de casebres alumiados a petróleo, são uma espinha de traves coberta com telhas em escama. Cavernames de navio, é o que me lembram. Pequenas arcas de Noé. Num ou noutro há o gato e a criança de barriga nua e de pernas arqueadas; num ou noutro há o cachorro e a galinha presa pela pata a uma cadeira, e em grandes alguidares de folha remexem enguias pardacentas. A noite está tranquila, húmida talvez. "

No Delfim
José Cardoso Pires

Aqui sem lhe perseguir as mulheres, perseguindo antes a imagem na escrita, a descrição perfeita. Não tirava nem punha nada e essa impressão vai-se mantendo ao longo do livro, ao longo da obra. Aqui gostei sem adjectivos suficientes do "talvez" final, um golpe último no paralelo terra-mar que ia correndo.

E deste lado ficam as curvas ao longo do rio, para a vida toda.


"Por mim, no que toca ao modo de narrar, prefiro correr o risco de jamais atingir o ponto impreciso da clareza a pecar por excesso, ultrapassando-a. Das duas faces desastrosas do gume, a última parece-me a pior porque resvala para o tom impositivo que anula os valores da sugestão e que impede a leitura de se tornar em si mesma uma segunda criação".
Sobre si próprio fala Cardoso Pires, que tirei daqui.

2 comments:

Tozzola said...

Se for para mim, agradeço; se não for, agradeço na mesma.
E na mesma onda de vénia sentado à mesa, agradeço a distinção de colega. Ao sol, à sombra e em qualquer lugar.
Sem mais...

Ana V. said...

Vejo que já regressaste recarregado! :) Distinção de colega será, outra vénia e um beijinho alentejano.
Ana

 
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