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por onde contar árvores é tão difícil como contar estrelas, longe da poluição luminosa. ondas verdes que descansam. por muito que goste das árvores afiadas sobre a neve do Norte ou do verde idílico da Europa francesa e italiana, esta é a minha paisagem e é o cheiro que reconheço melhor, logo a seguir aos musgos da serra da lua. o horizonte em rosa, o arredondado de tudo, verde escuro, o sobreiro a mais bela das árvores, o branco e o azul, esqueço e lembro que o Alentejo é facilmente a terra mais fotogénica que se pode encontrar. o carteiro podia ter sido filmado aqui, todos os sam shepard pertencem a estas bandas também, apenas mantido à distância por gerações de neo-realistas e marialvas a cavalo. talvez não nos seja assim tão fácil criar símbolos, temos pés de pedra no passado. desde o Vimieiro, pequena localidade sui generis onde cada casa é para olhar à água azul forte de Montargil. nas margens, sinais da recente descoberta citadina, novas construções a anunciar coisas fechadas, decerto "de luxo", carreiros de palmeiras deslocadas em local privado. sentimentos contraditórios.
em Mora, um largo minúsculo concentra duas igrejas, cara a cara, o café, o banco, a papelaria e a farmácia (e que mais é preciso?), acertei no restaurante O Afonso, uma casa com cinquenta e cinco anos orgulhosos, com quadros na parede, medalhas, prémios e o apreço de Miguel Sousa Tavares e Marcelo Rebelo de Sousa. ficou um pouco aquém da expectativa embora a simpatia e o profissionalismo sejam de muitas estrelas. dedicada à caça, tudo resto é trivial. a pedir alguma renovação para que se continue a bem alimentar a corrente de reconhecimento exibida na parede. a estrela de Mora é, claramente, o Fluviário. bem construído, bonito, bem organizado por quem transmite conhecimento com qualidade. de zero a dez, vai um dez redondo. dá gosto ver projectos assim no meu país. e de lá veio uma anaconda de brincar enquanto a verdadeira se enrolava à vista. gostámos da sala de actividades, da cascata, do edifício, da passadeira exterior e, mais que tudo, dos aquários. enquanto as lontras dormiam, ouvi cá fora junto aos cisnes negros a sua história e como o que se pensava ser um casal eram afinal dois machos.
devagar pela maré verde oliva até chegar aos campos carregados de uva, as caves abertas para degustação e compra em redor de Estremoz, onde me dizem que há uma boa feira ao sábado. daí a Sousel é um passo. fora da vila e bem no alto, com quilómetros de vista para o pôr-do-sol alentejano, fica a pousada, gasta como uma mulher que envelheceu precocemente e que precisa agora de carinho. logo ao lado a igreja branca de risca azul guarda com fidelidade cristã uma das praças de touros mais orgulhosamente solitárias que já vi.
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