light gazing, ışığa bakmak

Monday, March 3, 2014

classe média portuguesa

viviam num apartamento bom, condomínio e casa nova, piscina, que os pais tinham comprado. duas filhas, uma delas pequena. tiveram vários negócios, uns melhores outros piores, todos acabaram e ficaram ambos desempregados. a certa altura decidiram alugar o apartamento e ir para uma casa mais barata. o apartamento alugou-se mas só por dois meses, o resto do ano ficou vazio. o homem foi obrigado a sair do país, para moçambique. a mulher ficou com as duas filhas em Portugal mas foi obrigada a deixar o apartamento mais pequeno que tinham alugado e mudar-se para uma cave no apartamento dos pais. este verão vão juntar-se ao pai em Moçambique.

- -

casaram, compraram apartamento, tiveram dois filhos e a vida corria normalmente. primeiro ficou ela desempregada, perto dos quarenta. os avós começaram a ajudar. mais tarde ficou o marido. tiveram de largar o apartamento, quando viram que a situação de desemprego de ambos se iria arrastar por tempo indeterminado, tentaram vendê-lo mas essa venda não foi possível durante meses. mudaram-se para uma casa antiga, até então vazia, herdada pelos pais.

- -

foi director de uma empresa de sucesso durante dez anos. no início da crise, a empresa não aguentou e ficou desempregado. casado e com dois filhos no colégio. a mulher professora manteve o emprego, mas passou a estar pouco em casa com a carga de explicações que foi obrigada a dar para equilibrar o orçamento. o homem faz serviços esporádicos.

- -

foi proprietário de uma empresa durante quase uma década. durante esse período casou-se, comprou casa e teve uma filha. a empresa não aguentou e ficou desempregado ele, ela manteve o trabalho. foi obrigado a ir trabalhar para fora para pagar as dívidas acumuladas da empresa e as despesas familiares.

- -


conheço-os: estas são pessoas da minha geração e um pouco mais novas, todas elas altamente qualificadas, todas elas no 'privado'. também nem é preciso dizer que todos eles davam trabalho a outros eles que ficaram desempregados.




2 comments:

Pecola said...

É uma tristeza. Infelizmente é impossível prever o futuro, mesmo tendo uma pessoa sempre um plano B ou C na manga [sempre brinquei com os Emprego 1, 2, 3, 20, mas nunca foram mais que isso, sempre planos B para o caso de o primeiro ir ao charco]. Tenho amigos / conhecidos nessas mesmas condições. E o que choca é que não são a excepção, são a regra. Só espero nunca vir a provar da mesma sorte. Porque lutar é uma coisa. Ter sorte é outra.

Ana V. said...

É isso: são a regra e dependem da sorte. Lutamos e estamos confiantes que podemos fazer qualquer coisa, desde que se possa trabalhar, mas não controlamos sempre o nosso destino, por mais salvaguardas que existam. Um retrato parecido pode ser feito dos outros dois grupos: os mais novos, nos vintes, que é suposto começarem agora a vida adulta e os mais velhos, os reformados. Somos um país mais devastado do que pensamos...

 
Share