light gazing, ışığa bakmak

Sunday, February 24, 2008

Vou deixar aqui um pedaço de marisco, nada mais do que um isco (para ti, Rui)

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- VELHO LAVAGANTE - respondo eu. E ele compreende e sorri.

(Dias antes tinha-lhe perguntado: "Sabes alguma coisa da vida dos lavagantes?". "Para mim", dissera ele, "um lavagante é um crustáceo primitivo, sem grandes requintes na cozinha. É mais saboroso que a lagosta e parece que mais selvagem porque não se adapta tão bem aos viveiros. Julgo que é tudo."

Então expliquei-lhe que o lavagante é principalmente um animal de tenebrosa memória, paciente e obstinado, e terrível nos seus desígnios. Contei-lhe como ele serve o safio que está nas tocas submersas levando-lhe comida a todas as horas, e como a sua existência anda presa a essa serpente estúpida de grandes sonos, vendo-a engordar, engordar, até saber que a tem bloqueada, incapaz de sair do buraco porque o corpo cresceu de mais, enovelou-se, e não cabe na abertura por onde podia libertar-se. "Nesse momento, fica sabendo, o lavagante servil aparece à boca da toca do safio mas já não traz comida. Vem de garras afiadas devorar o grande prisioneiro que alimentou durante tanto tempo.")

Excerto do novíssimo Lavagante - Encontro Desabitado de José Cardoso Pires. Um livro essencial, a ler já. Anos depois da morte do escritor excelentíssimo, que tenho visto tão esquecido das prateleiras, surge esta obra inédita, publicada pelo que foi o seu editor de muitos anos, Nelson de Matos. Este Lavagante serve também de obra primeira da nova editora Nelson de Matos. Com tais inícios, bons augúrios se anunciam. Vale a pena comprar já bastantes exemplares, um para uso próprio, os outros para ir presenteando todos os membros da família e amigos ao longo do ano.

7 comments:

Anonymous said...

Foi só o maior escritor de Portugal.Coisa pouca:)

Anonymous said...

E dos maiores do mundo....

Ana V. said...

Anonymus ilustris... é muito bom, este livro. Fininho fininho, mas cada página vale muitas. Beijo.

Anonymous said...

Desconfio que há muito lavagante por aí... com muito mel, muito mimo, e depois !tuca!.

Mas pensemos antes em coisas boas, alegres, em momentos de existência eternos, que é o que levamos desta vida. Beijinho grande e é óbvio que na próxima ida à Bertrand [que nervos, a Bertrand da minha zona ultimamente só muda os livros de sítio, novos novos, um ou dois e o resto, está quieto!] vou folheá-lo.

Ana V. said...

MAD a minha vida é um aquário deles. Mas depois há outras espécies.. Beijo e boa folheadela!

jorge vicente said...

não se pode fazer anos dois dias por ano?

Ana V. said...

:))))) acho que já ganhaste esse direito!

 
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